Do Vi o Mundo, do Azenha:
Making the Rich Happy
By ALEXANDER COCKBURN, no Counterpunch
Bem na hora das pesquisas de opinião do fim de ano, o presidente Obama se arrastou desde seu túmulo político, onde apenas um mês atrás coroas de flores eram colocadas em torno do sepulcro. O Comentariado* [NdoV:*conjunto de comentaristas que pensam igual, feito o PIG brasileiro] agora aplaude gravemente suas recentes vitórias no Congresso: repúdio às inibições do Don’t Ask, Don’t Tell sobre gays no serviço militar [NdoV: Ninguem perguntava, os gays não respondiam]; ratificação no Senado do tratado START sobre armas nucleares com os russos; passagem da lei de 4,3 bilhões de dólares — previamente bloqueada pelos republicanos — dando benefícios de saúde para os trabalhadores de resgate que atuaram nos ataques de 11 de setembro de 2001.
Algo está faltando em minha lista? Você notou? Com certeza: em primeiro lugar e adiante de tudo, o acordo com os republicanos sobre impostos, melhor descrito como um presente de 4 trilhões de dólares para os ricos dos Estados Unidos, com a extensão dos cortes de impostos do governo Bush. Com a toda importante rendição nos impostos conquistada, os republicanos não parecem se importar em dar a Obama uma minissérie de vitórias.
Não há muitos votos de eleitores em insistir que 1.500 armas nucleares não são suficientes para o Tio Sam, particularmente considerando que Obama fez seu truque usual de se render antes do início da batalha, um ano atrás, garantindo benefícios para o complexo industrial-militar. Seria inteligente negar benefícios para quem atuou no 11 de setembro ou manter os gays no serviço militar dentro do armário?
Presumivelmente agora os gays vão lutar com maior ferocidade, já que podem aparecer e se orgulhar. No que realmente interessa, depois de se reorganizar no recesso parlamentar, os republicanos provavelmente vão se manter acordados, embora no caso de um presidente que se rende sem fazer barulho a vigilância excessiva provavelmente é desnecessária.
Você dá 4 trilhões aos ricos e eles expressam seu agradecimento de forma contida. Os formadores de opinião “deles” elogiam o admirável espírito de compromisso dos integrantes do Congresso que se reúnem no bipartidarismo para manter o boteco aberto para fazer negócios.
É verdade, há os pessimistas, os tribunos de esquerda que dizem, acertadamente, que o grande “compromisso” foi, nas palavras do economista Michael Hudson, “todo para os ricos… não para promover estabilidade e recuperação econômica… mas para criar dívida pública que será entregue aos banqueiros, compromisso que as futuras gerações de contribuintes vão pagar”.
Foi um acordo de refinado cinismo, contendo uma pílula venenosa que foi descrita como um gesto generoso para os trabalhadores — uma redução de 120 bilhões de dólares em contribuições para a Previdência Social — redução da taxa de contribuição de 6,2% para 4,2% nos salários. Mas, na verdade, é uma armadilha, preparando a Previdência Social para se tornar subfinanciada no futuro e pronta para ser leiloada em Wall Street.
O fator definidor da política doméstica dos Estados Unidos nas últimas seis décadas tem sido o contra-ataque dos ricos contra as reformas sociais dos anos 30.
Vinte anos atrás o grande prêmio da Previdência Social — as pensões governamentais que mudaram a cara dos Estados Unidos na metade dos anos 30 — pareciam distantes das mãos de Wall Street. Nenhum presidente republicano poderia prevalecer diante dela. Teria que ser um trabalho sujo de um democrata. Clinton tentou, mas o escândalo sexual da [estagiária Monica] Lewinsky abortou sua tentativa.
Se Obama pode ser identificado com uma missão histórica em nome do capital é esta — e embora o sucesso não seja garantido, está mais próximo do que nunca.
É o que nos leva ao centésimo décimo segundo Congresso, refletindo os ganhos republicanos em novembro, que vai gastar a noite do 2 de fevereiro ouvindo a agenda “bipartidária” de Obama no discurso do Estado da União.
O site Politico — refletindo a opinião informada de Washington — recentemente previu que no próximo discurso, “o teleprompter-em-chefe vai anunciar cortes na Previdência Social”. Como Robert Kuttner do Politico especulou: Obama vai tentar esvaziar “cortes draconianos no orçamento que serão propostos pelo futuro presidente do comitê de Orçamento, o republicano Paul Ryan de Wisconsin, como condição para manter o teto da dívida. Isso, se espera, deve acontecer em abril”.
Mas com certeza para os progressistas, que estão furiosos com o presente dado por Obama aos ricos, e com os quais Obama conta para a reeleição em 2012, cortes na Previdência Social serão a última gota? Não conte com isso. Como bestas de carga política, os progressistas tem costas que podem sustentar virtualmente uma quantidade infinita de carga.
Contra a traição na questão de impostos, estes progressistas de classe média vão citar o Don’t Ask, Don’t Tell [NdoV: sobre gays no serviço militar]. A política da identidade [NdoV: de gênero, racial, etc.] vai derrotar a política de classe, o que tem sido o caso dos progressistas de classe média no último quarto de século.
E eles não vão se preocupar com outro fracasso de Obama: a incapacidade de aprovar o “Desenvolvimento, Ajuda e Educação para Menores Estrangeiros (DREAM)” no Congresso. Isso permitiria a milhões de filhos de imigrantes ilegais que chegaram aos Estados Unidos antes dos 16 anos de idade se tornarem residentes permanentes e depois cidadãos se se formarem no ensino médio, completarem o serviço militar ou a faculdade, além de não se envolverem com drogas.
Os republicanos bloquearam o projeto no Senado, embora ele pudesse ter sido aprovado se os democratas dessem uma demonstração de unidade. Mas a Casa Branca estava claramente pouco inclinada a gastar capital político nisso, da mesma forma que fracassou em seus compromissos com os negros ou com os sindicatos, cujo dinheiro e militância foram determinantes para eleger Obama em 2008.
Neste momento a taxa de aprovação de Obama, medida pelo Gallup, está em 46%, contra 48% que o desaprovam, tendo caído de 50% desde o outono. Ele está claramente no caminho da direita que Clinton adotou depois de 1994: guerras no Exterior (Iugoslávia para Clinton, Afeganistão para Obama); uma guerra contra o terror digna de Bush-Cheney, como exemplificado no abandono das promessas para fechar Guantanamo e a preparação de leis repressivas de espionagem depois do vazamento do WikiLeaks. Na última quinta-feira Bill Quigley e Vince Warren escreveram um artigo assustador neste site, “O Problema da Liberdade de Obama”:
“Assessores do governo Obama lançaram a ideia de criar um novo sistema legal para manter pessoas presas indefinidamente por Ordem Executiva. Por que? Para fazer alguma coisa com as pessoas que estão detidas ilegalmente em Guantanamo. Por que não seguir a lei e julgá-los? O governo sabe que não vai conseguir processá-los porque eles foram torturados pelos Estados Unidos. Guantanamo vai fazer aniversário de nove anos — uma mancha horripilante no compromisso dos Estados Unidos com a Justiça. O presidente Obama sabe muito bem que Guantanamo é a mais poderosa ferramenta para recrutamento daqueles que desafiam os Estados Unidos. Infelizmente, esta proposta de detenção indefinida vai prolongar os efeitos corrosivos das detenções ilegais e imorais de Guantanamo, condenadas mundialmente. Os problemas práticos, lógicos, constitucionais e de direitos humanos da proposta são incontáveis”.
Clinton, que se autointitulou ‘Comeback Kid’, adotou a mesma posição em 1996 com o seu Ato da Pena de Morte Antiterrorista, que foi a primeira cena do Ato Patriota [NdoV: Adotado por George W. Bush pós-11 de setembro]. Clinton lançou seu bem sucedido ataque contra o welfare [NdoV: Grosseiramente, o equivalente do Bolsa Família] em seu segundo mandato, da mesma forma que agora Obama busca consumar seu ataque contra a Previdência Social.
Assim como aconteceu com Clinton, temos um presidente oportunista e neoliberal sem um fio de princípio intelectual ou moral. Temos liberais desconsolados e uma imprensa dizendo que Obama está demonstrando maturidade admirável ao entender o que bipartidarismo realmente representa. Como Clinton, Obama é afortunado de ter progressistas à sua esquerda felizes de celebrar o DADTell [NdoV: admissão dos gays no serviço militar] como consolo para apoiar a política suja e sem espinha de Obama. As coisas nunca mudam muito, como demonstrado pelo fato de que Jeb Bush, ex-governador da Flórida e irmão de George W., parece estar pronto para disputar a candidatura republicana [em 2012].